Com depoimentos de Michel Teló e Luan Santana, entre outros astros do gênero, filme descortina os bastidores de segmento musical que rende bilhões. Resenha de documentário musical Título: O fenômeno sertanejo Direção: Fabrício Bittar Produtora: Clube Filmes Exibição: Canal de TV Music Box Brasil, 9 de abril, às 22h Cotação: * * * 1/2 ♪ Aberto em 1929 pelo escritor e folclorista paulista Cornélio Pires (1884 – 1958) com a gravação de temas caipiras, o mercado de música sertaneja se industrializou e ganhou dimensões superlativas ao longo dos últimos 90 anos. Impulsionada pelos astros do universo pop sertanejo, a atual onda de lives turbinadas e patrocinadas é somente um sintoma da força de indústria que gira até mesmo em meio a uma pandemia como a do covid-19. Com exibição programada pelo canal de TV Music Box Brasil para as 22h de quinta-feira, 9 de abril, o inédito documentário O fenômeno sertanejo enfoca essa parcela vasta do universo pop brasileiro sob prisma empresarial. Estruturado em nove capítulos pelo diretor Fabrício Mattar, o documentário inicia com breve resumo da história da música sertaneja, abordando o pioneirismo de Cornélio Pires e da dupla Tonico & Tinoco, astros caipiras das décadas de 1940 e 1950. Chitãozinho & Xororó tem o sucesso de 'Fio de cabelo' lembrado no documentário 'O fenômeno sertanejo' Divulgação / Music Box Brasil Mote do segundo capítulo, a explosão nacional da dupla Chitãozinho & Xororó com a gravação da música Fio de cabelo (Darci Rossi e Mariano, 1982) é corretamente abordada como o marco de uma primeira expansão do território sertanejo rumo aos centros urbanos. A dupla paranaense integra o time de entrevistados do diretor ao lado de Luan Santana, Michel Teló e Naiara Azevedo, entre outros. A narrativa enfoca rapidamente a consolidação do mercado urbano sertanejo ao longo dos anos 1990 – com as duplas Chitãozinho & Xororó, Leandro & Leonardo e Zezé Di Camargo & Luciano à frente dessa nova expansão – e logo avança para o surgimento em 2005 do gênero rotulado como sertanejo universitário. É a partir deste terceiro capítulo que a produção da Clube Filmes se detém no fenômeno sertanejo com espírito mais crítico. Pioneira desse subgênero do sertanejo, a dupla universitária João Bosco & Vinicius conta como esse som mais pop (e já totalmente descolado da raiz caipira) se alastrou pelo Brasil a partir de Campo Grande (MS), atraindo primeiro estudantes universitários e, depois, um público mais amplo e heterogêneo que quer tão somente se divertir ao som de música para baladas, já impregnada de códigos do pop universal. Até que virou grande negócio. Um negócio que movimenta bilhões em todo o território nacional. E que põe o faturamento acima da arte. “Está ficando tudo muito pobre”, acusam Bruno & Marrone. “É sertanojo. Esse pessoal não é artista. Esses jovens caem nas mãos de empresários que sugam o sangue deles”, brada um professor universitário, ressaltando o baixo nível cultural de alguns artistas e do público que consome a música pop sertaneja. “Os produtos estão muito parecidos. Virou muito business”, corroboram João Bosco & Vinicius. Michel Teló no documentário 'O fenômeno sertanejo' Divulgação / Music Box Brasil Projetado internacionalmente com o sucesso da gravação da música Ai, se eu te pego (Aline Fonseca, Amanda Cruz, Antonio Dyggs, Karine Vinagre e Sharon, 2008), Michel Teló pega mais leve do que os colegas famosos (“Não é só dinheiro que manda”, defende na parte final do documentário), mas sem ser tão diplomático quanto Luan Santana, cuja participação no filme é sucessão de depoimentos vagos e embevecidos sobre o massivo sucesso sertanejo. Enquanto descortina alguns bastidores do universo pop sertanejo, o documentário aborda, sem dar nomes aos bois, o monopólio de escritórios agenciadores de carreiras de astros e de candidatos a astros do segmento. A propósito, a dupla Leo & Raphael personifica no roteiro artistas que ainda estão no meio do caminho. E é curioso como eles apontam a barca de comida japonesa – presente em camarins de cantores abastados como Matheus & Kauan – como símbolo do status que Leo & Raphael ainda não alcançaram. Já Sorocaba, da bem-sucedida dupla com Fernando, enfatiza o impulsionamento monetário de visualizações de clipes e de streamings para forjar números grandiloquentes com a esperança de transformar o irreal em sucesso real através de ações de marketing. Luan Santana no documentário 'O fenômeno sertanejo' Divulgação / Music Box Brasil Nem sempre funciona, claro. “Ninguém tem o sucesso da fama”, ressalta Naiara Azevedo. Mas quem já tem fama quer entrar no nicho. “O sertanejo é o pop do Brasil”, sentencia Alok, DJ cuja participação em eventos do gênero é criticada por alguns entrevistados. Assim como também é atacada a mistura genérica de sertanejo com ritmos como samba e funk. Com imagens captadas em shows que atestam a grandiosidade do mercado, o documentário O fenômeno sertanejo tem o mérito de abordar o gênero sem romantismo. E, após enfocar a explosão das cantoras e compositoras no capítulo A resposta delas, o filme O fenômeno sertanejo se encaminha para o fim, deixando no ar que, a qualquer momento, uma novidade pode surgir no segmento. Até porque, como o documentário deixa bem claro de forma até repetitiva, o show não pode parar de render muito dinheiro para todos que fazem girar a máquina sertaneja.