Dupla Anavitória apresenta algumas canções certeiras no álbum ‘Cor’ sem se desprender do passado
Rita Lee e Lenine participam do disco lançado sem aviso prévio nesta sexta-feira, 1º de janeiro de 2021. Capa do álbum 'Cor', de Anavitória Breno Galtier Resenha de álbum Título: Cor Artista: Anavitória Edição: Anavitória Artes Cotação: * * * ♪ “Ao meu passado, eu devo o meu saber e a minha ignorância. As minhas necessidades e as minhas relações. A minha cultura e o meu corpo. Que espaço o meu passado deixa para a minha liberdade hoje? Não sou escrava dele”, sentencia ninguém menos do que Rita Lee ao recitar versos embutidos em Amarelo, azul e branco (Ana Caetano e Vitória Falcão), música que abre o quarto álbum de Anavitória com tributo à terra natal da dupla. Lançado sem aviso prévio nesta sexta-feira, 1º de janeiro de 2021, o disco mostra que Ana Caetano e Vitória Falcão tentam experimentar maior liberdade artística sem se desprender do passado que transformou a dupla – formada em 2013 em Araguaína (TO), cidade do interior do Tocantins – em um dos nomes mais lucrativos da indústria da música nos últimos cinco anos. “O norte é a minha seta, o meu eixo, a minha raiz”, aponta Anavitória em verso de Amarelo, azul e branco, faixa na qual sobressai a pulsação da percussão de Felipe Roseno e da bateria de Valmir Bessa. Com 14 músicas em repertório que somente se desvia do trilho autoral em Dia 34 (Tó Brandileone e Fábio Sá), o álbum Cor foi gravado com produção musical dividida entre Ana Caetano e Tó Brandileone, integrante do grupo paulistano 5 a Seco que já tinha sido arregimentado para pilotar o álbum anterior da dupla, N (2019), dedicado ao cancioneiro do compositor Nando Reis. Tal como já ocorrera em N, disco valorizado pela elegância dos arranjos, Cor é álbum de produção musical sobressalente. O arranjo de Terra (Ana Caetano), por exemplo, exemplifica a evolução de Anavitória nesse quesito. Tanto que há, em Cor, faixas em que o arranjo e a produção musical soam mais interessantes do que a canção em si, caso de Tenta acreditar (Ana Caetano e João Ferreira). Anavitória canta 14 músicas no quarto álbum da dupla, 'Cor' Breno Galtier / Divulgação Contudo, há munição certeira na safra autoral de Cor, primeiro disco da dupla sem o selo e o aval da Universal Music (o primeiro independente álbum, Anavitória, foi licenciado em 2016 para a gravadora multinacional). Explodir (Ana Caetano) é o fofolk pop romântico típico da dupla. Selva (Ana Caetano e Tó Brandileone) é canção sedutora, escrita com rimas feitas com palavras proparoxítonas em letra que soa charmosa, ainda que distante da engenhosidade de Construção (Chico Buarque, 1971). Eu sei quem é você (Ana Caetano) é balada que soa tão convencional quanto fluente. Cigarra (Ana Caetano) é canção afetuosa, levada com delicadeza no ukelele (tocado por Tó Brandileone) e no violão (de Conrado Goys) com a base suave da percussão de Felipe Roseno e do próprio Tó. Ainda é tempo (Ana Caetano) é balada conduzida pelo piano de Mari Jacinhto em gravação que esboça a densidade possível na obra de dupla que canta para geração de ouvintes refratários a qualquer rasgo de profundidade. A balada Abril (Ana Caetano) segue essa linha densa no mesmo limite da intensidade suportada pelo público de Anavitória. Te procuro (Ana Caetano, Nina Fernandes, Saulo Fernandes) é canção que expia a sofrência de amor doído. Já Carvoeiro (Ana Caetano e Deco Martins) sinaliza, já na 13º faixa, que Cor é álbum longo demais para os padrões fonográficos dos anos 2020, embora seja louvável a atitude da dupla de não apresentar o álbum fatiado em EPs ou singles, como virou praxe no mercado. Das 14 faixas, há resquícios de maior inventividade em Te amar é massa demais (Ana Caetano) – música light que cai em suingue percussivo evocativo da batida do samba-reggae – e Lisboa (Ana Caetano e Pedro Novaes), boa canção final que junta as vozes de Anavitória com o canto suave de Lenine. Lenine é participação inusitada e realmente especial em Cor, álbum que expõe Ana Caetano e Vitória Falcão ainda presas a um passado que lhes trouxe glória precoce. O tempo é agora, como a dupla já sentenciou no título do segundo álbum das artistas, lançado em 2018, mas, sim, é difícil não se deixar escravizar pelo sucesso.
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Modelo que participaria do Miss México morre aos 21 anos
Organização do evento fez o anúncio nas redes sociais e lamentou a morte de Ximena Hita. Causa do falecimento não foi informada. Ximena Hita Reprodução/Miss Mexico Organization Uma das 32 participantes do Miss México que aconteceria em 2021 morreu nesta sexta-feira (1), anunciou a organização do evento. Sem dar muitos detalhes, o concurso lamentou a morte de Ximena Hita em posts nas redes sociais: "Sempre lembraremos de você". Ximena tinha 21 anos, de acordo com informações da emissora mexicana TV Azteca. A causa da morte e suas circunstâncias não foram informadas. Primeira finalista trans do Miss Universo Nepal faz história A modelo mexicana foi eleita Miss Aguascalientes em 2019 (Aguascalientes é um estado na região central do México). Segundo a descrição de seu perfil no Instagram, Ximena era estudante de enfermagem e trabalhava como paramédica. Initial plugin text PLAYLIST: vídeos do Semana Pop
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Centenário de Zé Kétti acende a luz sobre compositor que deu voz às alegrias e desilusões do morro
Álbum de Jards Macalé e ciclo de shows celebram os 100 anos do criador de sambas como 'Opinião' e 'Malvadeza Durão'. ♪ MEMÓRIA – “Acender as velas / Já é profissão / Quando não tem samba / Tem desilusão”, reportou Zé Kétti nos versos de Acender as velas (1964), um dos sambas que mais bem traduzem a natureza politizada da obra deste compositor, cantor e ritmista carioca. Em 2021, espera-se que o centenário de nascimento de José Santos Flores (16 de setembro de 1921 – 14 de novembro de 1999) acenda novamente a luz do Brasil para a importância do legado do compositor. Por ora, há no horizonte álbum gravado por Jards Macalé nos Estados Unidos no fim de 2019 com o trio do percussionista Sergio Krakowski – somente com músicas de Zé Kétti – e ciclo de shows no Centro Cultural Banco do Brasil que, a partir deste mês de janeiro, reapresenta os sambas de Zé Kétti nas vozes de cantores como Zé Renato, cuja obra fonográfica inclui álbum dedicado ao cancioneiro do compositor, Natural do Rio de Janeiro (1996). Zé Kétti – cujo apelido da infância tornado nome artístico é grafado com dois 't', embora comumente seja escrito na mídia com um – é celebrado sobretudo pela criação do samba A voz do morro, apresentado na voz do cantor Jorge Goulart (1926 – 2012) em disco gravado em setembro de 1955. Ode ao samba, A voz do morro romantizou um Brasil feliz e foi o primeiro grande sucesso de Zé Kétti, que começara a compor no fim dos anos 1930 e tivera a primeira música gravada em 1946, Vivo bem, pelo cantor Ciro Monteiro (1913 – 1973). Antes da explosão de A voz do morro, o sucesso começou a bater na porta do compositor quando a cantora Linda Batista (1919 – 1988) gravou em 1951 o samba Amor passageiro (Zé Kétti e Jorge Abdala), hit do Carnaval de 1952. Nascido e criado entre bairros do subúrbio carioca, como Inhaúma e Piedade, Zé Kétti subiu muito os morros da cidade e, neles, apreendeu a sintaxe do samba que, no caso das criações do compositor, muitas vezes nascia no batuque suave de caixa de fósforos. Filho e neto de músicos, o artista ascendeu a partir dos anos 1950 quando associou à obra ao engajado Cinema Novo e passou a fazer sambas com fortes tonalidades sociais. Dessa cepa, são Malvadeza Durão (1959) – samba visionário sobre a morte de líder do morro “valente, mas muito considerado” – e Opinião (1964), composição que batizou show teatralizado que uniu Zé Kétti a Nara Leão (1942 – 1989), cantora que, a partir de então, se tornaria uma das principais intérpretes do compositor. Contudo, seria redutor enquadrar somente na moldura social a obra de Zé Kétti, artista cuja trajetória perdeu impulso a partir da década de 1970, embora o compositor jamais tenha deixado de ser gravado com regularidade. Também levam a assinatura de Zé Kétti a marcha-rancho Máscara negra (Zé Kétti e Hildebrando Pereira Passos, 1966) – sucesso do Carnaval de 1967 na voz de Dalva de Oliveira (1917 – 1972) e desde então hit certeiro nos salões – e a obra-prima Mascarada, composta em 1964 com melodia sublime do bamba Elton Medeiros (1930 – 2019), que lançou o samba em 1966 em pot-pourri de disco dividido com Paulinho da Viola. Por tudo isso, 2021 é ano em que o Brasil deve celebrar Zé Kétti, compositor que deu voz às alegrias e desilusões do morro e do samba.
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Banda Biquini Cavadão prepara disco com canção inédita que crê na cura do mal
Veja a letra de 'Nada é para sempre', composição de Bruno Gouveia em parceria com Marcelo Hayena. ♪ O grupo Biquini Cavadão prepara para 2021 um disco com músicas inéditas – o primeiro no gênero desde o álbum As voltas que o mundo dá (2017). Uma das composições garantidas no repertório autoral é Nada é para sempre, canção com a qual o vocalista Bruno Gouveia retoma a parceria com Marcelo Hayena, do grupo Uns & Outros. Composta com inspiração na escuridão do mundo em tempos de pandemia e retrocessos sociais, a canção Nada é para sempre professa esperança, crendo com fé na cura do mal e em dias mais claros e alegres. ♪ Eis a letra de Nada é para sempre, composição de Bruno Gouveia com Marcelo Hayena, parceiros em músicas anteriores como O seu herói (1989), A pena implacável (1990) e Depois do temporal (2006): “Que todo mal encontre uma cura Que o medo nos dê lugar à luta E um novo dia Afaste a escuridão Que a verdade enfim prevaleça E a gente nunca mais se esqueça Que o amor (e não o ódio) Somente ele é capaz de uma revolução Que o preconceito seja derrotado Todo choro silenciado Só pra ouvirmos uma voz (do coração) Que o presente, apesar de tudo, Abra os braços para o futuro E o mundo inteiro se abrace e Cante uma mesma canção Nada é para Sempre Tudo vai ser diferente Toda tristeza um dia passa E um novo dia nascerá”
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Luiz Caldas entra em 2021 na batida do rap ao arremessar álbum ‘Pedrada!’
♪ Luiz Caldas entrou em 2021 na batida do rap. Dando continuidade ao projeto de lançar um álbum temático por mês, com repertório inédito e autoral, o cantor, compositor e músico baiano arremessou em 1º de janeiro Pedrada! – disco cujas dez faixas gravitam em torno do universo do hip hop. Com letras verborrágicas, Caldas dá voz a músicas que abordam questões sociais e políticas, casos de Desigualdade, Roubalheira, Ratos ditadores e Ku Klux Klan. André Abujamra participa do álbum na faixa Em nome de Tupã, encarnando o Pajé Abu. Além de Abujamra, o álbum Pedrada! traz o jovem cantor e compositor baiano Felupz, convidado de O mundo é de todo mundo. Caldas assina sozinho nove das dez músicas do disco. A exceção é O poder um dia acaba, composição também creditada a Antônio Romero. As programações do álbum Pedrada! foram feitas por Luiz Caldas com o baixista Gigi Cerqueira, o guitarrista Léo Brasileiro, o baterista Tito Oliveira e Claudinho Guimarães. Capa do álbum 'Pedrada!', de Luiz Caldas Divulgação
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Lu Andrade, ex-Rouge, volta ao disco com o EP ‘Elo’
♪ Onze anos após lançar o primeiro EP solo, Luciana Andrade (2010), a cantora e compositora mineira Lu Andrade – projetada nacionalmente nos anos 2000 como integrante do grupo feminino Rouge – lança um segundo EP autoral, Elo, produzido pelo conterrâneo Luccas Mourão e programado para ser lançado na terça-feira, 5 de janeiro. Com seis músicas (entre elas, Chuva, Eu queria dizer adeus, Foi fácil e Um dia a gente volta a se cruzar na rua), o EP Elo foi gravado em 2019 e iria sair em 2020, mas, por conta da pandemia, teve o lançamento adiado para o início deste ano de 2021 e chega ao mercado fonográfico em versão reformulada, com músicas e arranjos diferentes da versão original. Na visão de Lu Andrade, Elo é o primeiro real disco da carreira solo da artista, ainda que, além do EP de 2010, a discografia da cantora já inclua dois singles, Mind and heart e Amanheceu, lançados em 2012 e 2014, respectivamente. Capa do EP 'Elo', de Lu Andrade Divulgação
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G1 Ouviu #122 – Kali Uchis, a colombiana que vai do reggaeton ao soul ‘caliente’
Cantora estourou com R&B e fala ao G1 sobre 2º disco com letras em espanhol, sem preconceito com ritmos latinos: 'Meus primos acham um lixo, mas eu gosto'. Ouça podcast. Você pode ouvir o G1 ouviu no G1, no Spotify, no Castbox, no Google Podcasts ou no Apple Podcasts. Assine ou siga o G1 Ouviu para ser avisado sempre que tiver novo episódio no ar. O que são podcasts? Um podcast é como se fosse um programa de rádio, mas não é: em vez de ter uma hora certa para ir ao ar, pode ser ouvido quando e onde a gente quiser. E em vez de sintonizar numa estação de rádio, a gente acha na internet. De graça. Dá para escutar num site, numa plataforma de música ou num aplicativo só de podcast no celular, para ir ouvindo quando a gente preferir: no trânsito, lavando louça, na praia, na academia… Os podcasts podem ser temáticos, contar uma história única, trazer debates ou simplesmente conversas sobre os mais diversos assuntos. É possível ouvir episódios avulsos ou assinar um podcast – de graça – e, assim, ser avisado sempre que um novo episódio for publicado. G1/Divulgação
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Larry King é internado com Covid-19
Apresentador de 87 anos recebe tratamento há mais de uma semana e não pode receber visitas, segundo fontes da família. Larry King Richard Drew/AP O lendário apresentador de TV Larry King está internado com Covid-19 há mais de uma semana, segundo informou a CNN dos Estados Unidos neste sábado (2). De acordo com o canal de TV, onde King comandou um programa de entrevistas por mais de 25 anos, fontes da família informaram que o apresentador de 87 anos recebe tratamento no Centro Médico Cedros Sinai, em Los Angeles. King tem diabetes tipo 2, um dos fatores de risco para a Covid-19, e retirou um câncer de pulmão em 2017. Devido aos protocolos de saúde adotados para conter o avanço da Covid-19, ele não pode receber visitas da família durante a internação. No ano passado, perdeu dois de seus cinco filhos em poucas semanas: Andy, aos 65 anos, após sofrer um ataque cardíaco; e Chaia, aos 51, devido a um câncer de pulmão. Em 2020, King apresentou seu talk show "Larry King Now", participou do programa de notícias "Extra", da sitcom "Maxxx" e de dois especiais de TV, além de ter produzido quatro episódios da série "In Case You Didn't Know with Nick Nanton".
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Álbum de 1971 que consolidou reinado de Roberto Carlos faz 50 anos com relevância e atualidade
♪ MEMÓRIA – De agosto de 1965 a janeiro de 1968, Roberto Carlos encarnou com perfeição o rei da juventude no castelo construído pela Jovem Guarda, primeiro movimento pop da música do Brasil. A partir do álbum intitulado O inimitável e lançado no dezembro de 1968, o cantor iniciou inteligente processo de transição da fase juvenil para o universo predominantemente romântico do mundo adulto. O rito de passagem foi desenvolvido nos dois posteriores álbuns de 1969 e 1970, grandes discos embebidos na música negra norte-americana que atestaram a evolução de Roberto Carlos como compositor, sempre em parceria com Erasmo Carlos. Lançado em dezembro de 1971, o álbum Roberto Carlos sedimentou a transformação gradual do artista e consolidou o reinado do cantor no Brasil conformista e anestesiado do inicio da década de 1970. A ilustração do cantor na capa do LP já simboliza a virada pela exposição do semblante mais adulto. Emblemático, esse disco completa 50 anos em 2021 – ano em que também Roberto faz 80 anos em 19 de abril – sem perder a relevância, tanto pelo repertório irretocável quanto pela produção musical capitaneada por Evandro Ribeiro, homem forte da diretoria da gravadora CBS e decisivo na trajetória fonográfica de Roberto Carlos, com quem trabalhou de 1963 a 1983 – não por acaso, o período mais expressivo da discografia do cantor. Também não por acaso, o álbum Roberto Carlos de 1971 foi o primeiro disco gravado pelo artista nos Estados Unidos – em outubro de 1971, no estúdio da gravadora CBS em Nova York (EUA), após pré-produção feita na cidade do Rio de Janeiro (RJ) em setembro daquele ano – com arranjos (geralmente orquestrais) criados e regidos pelo pianista e maestro norte-americano Jimmy Wisner (1931 – 2018). Somente duas faixas saíram sem a assinatura de Wisner porque foram previamente gravadas para a série de coletâneas As 14 mais e reaproveitadas no álbum. Uma delas é Amada amante (Roberto Carlos e Erasmo Carlos). Balada gravada em 1º de maio de 1971, Amada amante fechou o disco, levando para a casa da tradicional família brasileira uma canção sobre relação extraconjugal, ainda que a letra pudesse ser lida como declaração de amor à mulher oficial (como entendeu Nando Reis ao regravar a música para álbum com o repertório de Roberto Carlos lançado em 2019). A outra faixa sem o toque orquestral de Jimmy Wisner foi gravada entre junho e julho de 1971. É Eu só tenho um caminho, soul de Getúlio Côrtes, compositor identificado com o universo da Jovem Guarda. Outro compositor associado à Jovem Guarda, Renato Barros (1943 – 2020), herói da guitarra no exército da juventude brasileira, comparece no disco como autor de Você não sabe o que vai perder, rock imerso na levada de rhythm and blues, uma das matrizes do gênero. Você não saber o que vai perder é música que poderia figurar em qualquer disco de Roberto Carlos na fase da (então ainda recente) Jovem Guarda – fato que denota o cuidado do cantor na condução da transição. Em que pesem os ecos do reinado juvenil, o álbum Roberto Carlos de 1971 reforça sobretudo a assinatura romântica do artista, a começar pela referencial canção Detalhes (Roberto Carlos e Erasmo Carlos), desde então música obrigatória no roteiro de qualquer show do cantor. Com elevada autoestima (traço notório do caráter do artista, aliás), o eu lírico da canção exprime confiança no poder de permanecer na memória da mulher que o deixou. Primeira conexão de Roberto Carlos com a obra de Caetano Veloso, a gravação do blues Como dois e dois – música inédita do compositor baiano, enviada a Roberto por Caetano do exílio em Londres – se diferencia no disco por trazer, ainda que de forma cifrada, referências à sombria situação política do Brasil em 1971. Era sintomático ouvir verso como “Tudo vai mal, tudo” na voz de Roberto, cantor criticado na época (e ainda hoje) por evitar tomadas explícitas de posições. Mas é justo lembrar que, no mesmo disco, o explosivo soul Todos estão surdos (Roberto Carlos e Erasmo Carlos) – sequência do spiritual Jesus Cristo (1970) no cancioneiro religioso de Roberto – pedisse paz e criticasse as guerras e a “covardia surda” em letra cheias de referências a Jesus. Mesmo sob a égide religiosa, Todos estão surdos é música política. E, sob o viés político, Caetano Veloso também está presente subliminarmente no álbum através da canção Debaixo dos caracóis de seus cabelos, composta por Roberto e Erasmo em intenção do colega, então tristonho por ter sido forçado pelos militares a deixar o Brasil. Contudo, as canções românticas já dão o tom primordial do álbum. Bonitas canções, faça-se justiça. A apaixonada balada A namorada (Maurício Duboc e Carlos Colla) e o melancólico bolero Se eu partir (Fred Jorge) são composições de melodias fluentes e sedutoras. Nessa seara sentimental, merece menção honrosa a inspiração da dolente balada De tanto amor, uma das obras-primas do cancioneiro romântico de Roberto e Erasmo, confiada primeiramente a Claudette Soares, intérprete original da composição em momento luminoso da trajetória da cantora. Dentro desse repertório adulto, o tom intencionalmente impostado no fox-trote I love you (Roberto Carlos e Erasmo Carlos) – usado para parodiar os cantores românticos da fase pré-Bossa Nova – soa deslocado no disco. Até porque é incoerente com a opção estética de (grande) cantor que sabe intensificar os tons para interpretar músicas mais emotivas, como o disco demonstra na gravação de Traumas (Roberto Carlos e Erasmo Carlos), canção psicológica de traços autobiográficos cuja letra confessional alude de forma sutil ao acidente na infância que fez o artista ter que amputar parte da perna direita. Enfim, são poucos os discos que, após 50 anos, conservam o encanto e, de certa forma, a atualidade por tocar em temas atemporais como o (des)amor, a luta pela paz e as queixas de que, sim, “tudo vai mal”. O álbum Roberto Carlos de 1971 é um desses discos e não surpreende que, depois dele, Roberto Carlos tenha se entronizado de forma vitalícia como um dos cantores mais populares do Brasil em todos os tempos.
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Maria Bethânia protesta contra morte do menino Miguel em álbum gravado com músicos João Camarero e Zé Manoel
Cantora reúne composições de Adriana Calcanhotto, Chico César e Tim Bernardes em disco previsto para ser lançado neste ano de 2021. ♪ Em 2021, os seguidores de Maria Bethânia ouvirão o primeiro álbum com músicas inéditas gravado pela artista em estúdio desde Meus quintais (2014). Trata-se do primeiro disco da cantora desde o controverso Mangueira – A menina dos meus olhos (2019), tributo à escola de samba Estação Primeira de Mangueira que dividiu opiniões entre o séquito da intérprete. Foi em setembro que Bethânia entrou no estúdio da gravadora Biscoito Fino, na cidade do Rio de Janeiro (RJ), para começar a gravar álbum cujo repertório extrapola as músicas apresentadas pela artista no roteiro do show Claros breus (2019). Não há, por ora, informações oficiais sobre o disco. Mas sabe-se que o álbum marca a estreia na discografia de Bethânia de dois músicos excepcionais, o violonista João Camarero e o pianista Zé Manoel, este requisitado pela cantora a partir da audição do disco Só (2020), lançado por Adriana Calcanhotto no ano passado. E por falar em Calcanhotto, duas músicas da compositora figuram no repertório gravado por Bethânia. Inédita em disco, A flor encarnada já fazia parte do roteiro do show Claros breus. Já 2 de junho é canção dissonante composta por Calcanhotto em protesto contra a morte recente e revoltante de Miguel Otávio Santana da Silva (17 de novembro de 2014 – 2 de junho de 2020), menino pernambucano que perdeu a vida, aos cinco anos, por negligência de Sari Mariana Costa Gaspar Côrte Real, patroa da mãe de Miguel, a empregada Mirtes Renata Santana de Souza. Calcanhotto apresentou 2 de junho na transmissão online do show Só (2020) em 5 de setembro, lançou single com a música duas semanas depois, em 18 de setembro, e revelou em entrevista ao programa Conversa com Bial (TV Globo), exibida em dezembro, que a música fazia parte do próximo álbum de Bethânia. De Chico César, compositor que entrou na discografia de Bethânia no mesmo álbum Âmbar (1996) em que a cantora deu voz pela primeira vez a uma música de Calcanhotto, a intérprete grava Luminosidade (música do show Claros breus inédita em disco) e sorve Da taça (2015) juntamente com o hit sertanejo Evidências (José Augusto e Paulo Sérgio Valle, 1989) – tal como fazia no show de 2019. Outra música do show selecionada para o disco é Bar da noite (Bidu Reis e Haroldo Barbosa, 1953), registrada em clima de intimidade. Além dos já mencionados João Camarero e Zé Manoel, o baixista Jorge Helder integra o time de músicos arregimentados para a gravação do álbum. Diretor musical do show Claros breus, o maestro Letieres Leite também foi chamado por Bethânia para dar forma ao disco em que a cantora grava pela primeira vez uma música do compositor paulistano Tim Bernardes, por quem a artista já tinha revelado publicamente ter especial admiração.
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